terça-feira, 13 de novembro de 2007

Euzébio, funcionário público.





Euzébio sonhava em ser astronauta, mas quando descobriu que a lua não era de queijo, quis ser jogador de futebol. Aos 12, Euzébio furou o pé em um prego no meio da pelada e ele próprio fez seu curativo, resolveu que ia ser médico. Um dia quis ajudar Joaquim que tinha caído da bicicleta, e deslocou o braço esquerdo do amigo tentando ajeitar o direito. Aos 15, vendeu as figurinhas do álbum da copa e comprou a última playboy do mês de setembro, resolveu ser economista, aos 17 errou o troco ao comprar o pão para sua mãe e levou uma esculhambação que o fez largar o futuro glorioso e pensar em ser dono de padaria, aos vinte quis ser cantor, aos vinte e cinco quis advogar, aos trinta professor, com trinta e oito só quis nadar, com quarenta descobriu a matemática, quarenta e dois a agronomia, com cinqüenta a engenharia e cinqüenta e sete não sabia. Hoje aos sessenta, Euzébio sonha em se decidir depois que se aposentar...

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Nos olhos de quem não vê.




Em terra de cego quem tem um olho vê menos.
Pensar em cegueira pode parecer um pesadelo. Uma vida no escuro levaria alguns à loucura, porém ao refletir mais profundamente, descobre-se que a falta de visão na verdade exige outra forma de encarar o real e, pode desenvolver nossa subjetividade e nos levar aos caminhos mais diversos de auto-conhecimento e imaginação.
O músico e letrista Hermeto Pascoal, comenta sobre a sua forma de enxergar o mundo apesar de sua visão parcial: “Nunca senti falta da visão, porque não sei como os outros vêem, isso enriquece minha personalidade”.
A falta de um sentido tão importante, em um mundo cada vez mais visual, exige muita criatividade e coragem para enfrentar nossos próprios monstros e tabus, mas não passa de uma questão de ponto de vista.
Ponto de vista
“Se Romeu tivesse olhos de falcão não se apaixonaria por Julieta, pois os olhos dele veriam uma pele nada agradável”. Quando o escritor José Saramago afirma tal imagem, ele nos convida a uma nova forma de ver o valor que damos ao sentido visual, pois o excesso é perigoso e ver demais pode significar não ver nada.
O olhar mal treinado também pode nos enganar, por isso precisamos analisar todos os aspectos de um acontecimento antes de imprimir qualquer juízo sobre ele.
Como o professor de literatura Paulo Cezar Lopez esclarece: “Não existe realidade, apenas um olhar condicionado, cada experiência de olhar é um limite, a realidade está mediada por nossas experiências”. Paulo Cezar perdeu a maior parte de sua visão na adolescência e revela a sua mudança pessoal como conseqüência: “Depois que se fica cego, nossa subjetividade se abre em todos os aspectos, inclusive nas relações. O incômodo nos faz pensar”.
Pensamento
“Se o olho é a janela da Alma, então é necessário olhá-la com um olho diferente e, esse outro olho também é uma janela da Alma. A janela não olha, quem olha é o olho através dela”. O poeta Antônio Cícero comenta que tal metáfora não nos leva a uma realidade e dificulta o conhecimento sobre a visão, “porque você vai ao infinito e nunca chega na alma”, diz Cícero.
A partir deste pensamento sobre o olhar pode-se tirar a importância exclusiva dos olhos no momento do “enxergar”, afinal não vemos apenas com eles. É o que o cineasta americano Wim Wenders explica: “Vemos com os ouvidos, o cérebro, com o estômago e creio que em parte com os olhos, mas não exclusivamente”. Porém há quem dê muita importância à esse sentido, é o caso da atriz Marieta Severo que afirma que não ver o colega em cena, a desconcentra mais do que não escutá-lo. “ Minha cena se alimenta da troca com o outro feita através do olho no olho”, ressalta Marieta.
Ver ou não ver “that´s the question”?
Não enxergar, por tanto, é olhar além do que os olhos apreendem, e conseguir libertar o mais profundo sentido sobre algo ou alguém.
O neurologista e escritor americano Oliver Sacks desvenda sua “visão” sobre o assunto: “O ato de olhar não se limita ao visível, mas também ao invisível, é que chamamos de imaginação”.
A partir dessa fala de Oliver, a visão ganha um sentido ativo e importante que nega a idéia clássica de que o olho é uma janela. “Não podemos ver os olhos como janela da alma simplesmente, pois assim parece passivo e que as coisas apenas adentram. A alma e a imaginação também saem”, completa Sacks.
A importância da visão é uma marca intensa na humanidade, e se não ver nos leva além do visível, ver nos liga intimamente aos outros. É como a cineasta de animação inglesa Marjut Rimminen, que tem estrabismo profundo, comenta: “Treinei meus olhos, e hoje se olho para alguém, este alguém sabe que o estou vendo, antes as pessoas perguntavam com quem eu estava falando? Era muito desagradável, sentia falta desse contato que a visão oferece”, conclui Marjut.
Diante da “espetacularidade do horror” que o mundo apresenta e nosso conformismo com ele, com olhos saudáveis ou não, estamos todos cegos.
Terra de cego
Seguimos na ciranda do mundo, como diria o poeta “com olhos lentos e sãos”, para nos proteger de toda matéria negativa que a humanidade tem cultivado como causa e efeito de seus comportamentos, cada vez mais individualistas e egocêntricos. Mas a culpa é do que vemos?
Talvez a resposta seja positiva, mas o melhor é compreender que cada caso é um caso.
Hermeto Pascoal afirma que “A visão afasta a gente das coisas que realmente queremos ver”. Porém atribuir à visão tal destino, não seria de todo o correto.
Saramago nos esclarece ainda mais sobre esse papel da visão no caos social a que estamos nos encaminhando: “Nunca vivemos tanto na caverna de Platão como hoje, porque as imagens que nos mostram, substituem a realidade, estamos no mundo áudio-visual, olhamos sombras e cremos que são realidades”.
Estabelecer relações com o que vemos e o que sentimos, está cada vez mais distante e beira o contraditório, uma vez que o olhar pro si só não enxerga, é necessário sentimento para alcançar a real visão.
Neste mesmo sentido Oliver Sacks reforça: “Também vê-se com a mente, somos seres emocionais, nossa visão está intimamente ligada ao emocional, e depende dele para acontecer”.
Ainda sobre a desumanização do mundo através do olhar, pode-se atribuir parte culpa à necessidade de sustento e sucesso financeiro. É o capital regendo o que vemos.
“Antigamente os filmes deixavam um espaço nas entrelinhas para pensarmos sobre as cenas, hoje os filmes vem fechados, não nos dão tempo de sonhar, o sonho já vem pronto como querem que nós o recebamos”, comenta Wim Wenders sobre a falta de tempo que as mídias nos impõem.
Essa publicidade visual se torna cada vez mais excessiva e muda o sentido da visão: “Hoje nossos olhos não tentam nos dizer algo, tenta nos vender algo”, Conclui Wenders, que ainda soma ao consumismo a responsabilidade da nossa falta de atenção às coisas simples.
A falta de Auto-conhecimento e liberdade individual de se questionar sobre nossas atitudes, acaba trazendo à tona monstros que aniquilam nossas possibilidades de enxergar a verdade das coisas.
O filósofo francês Eugen Bavcar que, apesar de cego, é um fotografo famoso, revela as nuances que a visão (ou a falta dela), provocam no homem contemporâneo: “Vivemos em um mundo que perdeu a visão, a TV nos propõe imagens prontas, e não sabemos mais vê-las. Porque perdemos o olhar interior, o distanciamento. Vivemos numa espécie de cegueira generalizada”.
O fato é que, com ou sem a possibilidade da visão o mundo perdeu o interesse por ela, no sentido da contemplação ou mesmo absorção da realidade.
Os olhos, apesar de poderosos, estão se tornando uma janela passiva da alma, que consome imagens gratuitamente, e lesa os sentidos mais profundos das coisas mais simples. Mecaniza-se assim a humanidade, e as relações como um todo.
Homens enxergando o mundo sobre as óticas de outros destinando os seres do planeta à um futuro onde quem tiver um coração será rei!

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Panis et circencis



Escreverei sobre a falta de rumo em todos os sentidos, sobre o desalento e até a descrença:
Sabemos que, todos os dias, somos roubados. Que as coisas não vão bem. Sabemos juntos que o preço da carne subiu, e o nosso salário não acompanhou.
Juntos sabemos que as calotas polares estão derretendo depressa, sabemos que a culpa é de nossos desodorantes com aerossol, e ainda sim os usamos.
Sabemos que há fome por todos os lados, e que já falta Deus em nossos corações, Juntos acreditamos que não podemos mais. Que tudo está perdido. Faltam caminhos para os nossos pés.
Há miséria, há corrupção, descaramento, hipocrisia, covardia, e outros tantos “ias”, há saudade, há melindres e traumas. Tudo existe até esperança.
Então votamos, torcemos, elegemos, acreditamos e voltamos a comemorar: Comemoramos o fim das guerras, comemoramos o dólar que cai, comemoramos a morte de Hitler e Sadan, o futebol, o samba, a bunda na TV, o último capitulo da novela das oito.
É quando nos conformamos: não temos furacões, nem Tsunamis, não temos atentados homéricos, nem etnofobia. Não temos memória.
E nossos aviões continuam a cair, nossos sertões continuam com sede, mas não podemos parar.
A vida bate na janela do carro pedindo “o do pão”, não abriremos, havemos de seguir, para que não sejamos nós amanhã, com os dedos no vidro.
Seguimos cegos, surdos, mudos, loucos de revolta e borrados de medo. E desse momento em diante somos assaltados: nos levam o dinheiro, a moral, a esperança.
Então, ou escrevemos um manifesto triste para um comunicado de faculdade, pedindo ajuda para o mundo, ou ligamos a televisão e aceitamos viver em um mundo escrito por Manoel Carlos.

Meu Olhar Sobre Mim


Eu sou meu amor pelas coisas vãs, meu medo do beijo, eu sou minhas mentiras e minhas


verdades também, sou meu braço direito com defeito minha boca e nariz grandes.eu sou filho da


márcia e do mundo, sou meus irmãos e seus silêncios, sou o desejo pela dificuldade e o amor pela


clareza.eu sou o medo do perigo,eu sou minha gargalhada sacana e minhas baixarias cômicas,


sou em parte poesia em parte carne em chamas, sou as mulheres e os wísques de meu pai, sou o


parto difícil que me deu meu nome, sou o mar e o cio do vento, sou o ócio dos domingos e a


bagunça do meu quarto, deveras sou a arte na sua exência mais pura e genuína. sou meu


sincretísmo e meu amor ao Deus amigo sem regras para amá-lo,sou minhas incertezas


convíctas,meus palavrões afetuosos, sou a delícia do escuro e a beleza do claro,o amigo sem


preconceitos sem frescuras sem segredos sou o melhor amigo de quase todo mundo,sou o shop


de vinho do italiano,eu sou NEGRO, sou o navio negreiro recitado por Bethânia e cantado por


Caê, sou o Brasil e a Europa sou minas e bahia, sou drummond.eu sou a inocência das


prostitutas, o pecado das freiras, eu sou GORDO,o furo da dieta no fim de semana, o misticismo


dos leigos, "sou quase tudo o que dizem por aí", sou Márcio Moreira eu sou o além de mim.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Gente Grande





Passei a vida pescando segredos que conseguisse enxergar.Vi por entre as minhas dores um silêncio que me cavucava o peito. Me refiz nele... e acinzentei meus sorrisos.Fui crescendo por entre meus passos embriagados, quase sem chorar descobri a tristeza e tentei naturalidade.Por sua porta, dedilhei num passado meu agora, e cometi desvarios sem perceber que a noite inda não era plena, eu tinha marcas.De mãos vazias e corpo violentado, não conseguia mais ter crença, eram de sangue minhas lamurias e as manchas sobre minha camisa, eram de sangue e pó.Feito menino que descobre o doce, vi minha mãe sobre a delícia do sono, ela trazia botões de flor, não eram rosas, apesar de vermelhas, eram meus segredos que ela detinha, como se fora dela também.Eu, pasmo, continha meu choro, não queria parecer frágil, não queria ser frágil, não queria ser eu. Mas eu era, então me detive em colher meus silenciados, indizíveis, só meus, agora também dela, colhia meus botões de segredo em silêncio.Ela me sorria com o ar de quem me pôs na vida, eu a olhava com o ar de quem prefere a morte, preferi o coma do orvalho. Água sem vida que de tão pura nem mata sede. Antes essa do que a lágrima.Meus irmãos também viveram essa marca, dividi com eles o peso de não carregar nenhum, recriamos nossos acertos apartir dos erros comuns, sofremos a orfandade de pais em vida.Depois o agora virou mais tarde, e o dia seguinte já não pesava, cortamos nossos cordões com nossos criadores e descobrimos que a vida vem cercada de ausências, e que qualquer presença já não vale mais do que a vontade de estar livre.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

A estética do Olhar


Agora os olhos olham o destino e o silêncio. Olham o escuro e o depois do escuro.

Os olhos lêem e vendem luzes, e aprendem o verbo, e descansam na noite, e criam fantasmas, e se desfazem no olhar.

Eles cantam, abrem a alma e deixam a brisa do tempo entrar, olhos são janelas sempre abertas.

Fabricam sonhos, desvendam pecados. Se refugiam na pálpebra, mergulham em outros olhos.

Alguns, cegos, enchergam com as pontas dos dedos, analfabetos "lêem a mão de Paulo Freire" e voltam às premissas da fome.

Os olhos brasileiros, são vivos. São muitos. Pra lá de Um Milhão... Mas enchergam, mas são mudos, são muitos. Sãos ou não.

Assustados, tristes, obsenos, obtúsos, óbvios, olhos dizem quase tudo.

Com água, os olhos choram!

O caos, a beleza, o absurdo, tudo no mundo está nos olhos de quem vê, mesmo que fechados, os olhos sentem. Mais que um cisco, sentem a vida e o depois da vida.

Não envelhecem, logo secam, os olhos secam!

O que é que seus olhos tem visto? Olhos também guardam segredos!